Ainda se respira a memória do presidente Cristiano Magalhães em todos os cantos e recantos da Associação Recreativa e Desportiva da Macieira, em Lousada, quatro anos depois do seu falecimento. Em 2006, onde muitos só viram dívidas e instalações reféns das silvas, o antigo presidente viu um clube que rapidamente ultrapassou a dimensão do futebol, contribuindo para endireitar a vida de muitos jovens. São incontáveis os que se afastaram dos piores caminhos e os que sobreviveram a famílias disfuncionais flageladas pelo álcool ou a droga, com a ajuda da ARD Macieira.
Ainda hoje olhares trocados de respeito e reconhecimento são percetíveis, quando se cruzam na rua com Manuel Magalhães, fundador do clube e pai do antigo presidente, agora no papel de vice-presidente da direção do filho mais novo, Nuno. “É inevitável falarmos no Cristiano”, deixa escapar um progenitor de olhos a brilhar. “Ele tinha uma capacidade para ver aquilo que mais ninguém via”, completa, Manuel Magalhães, no meio de um rosário de histórias infindáveis, que foram acrescentando traços ao caráter do presidente falecido.
Em tempos, a Associação Recreativa e Desportiva da Macieira chegou a inscrever quase duas centenas de atletas na Associação de Futebol do Porto, que em 2006 ajudou a direção, então eleita, a recuperar as suas dívidas e a relançar o clube, “porque a malta queria jogar à bola, mas não tinha dinheiro”, recorda Manuel Magalhães. O bichinho do futebol estava bem vivo, mas era preciso fazer mais, porque muitas famílias nem recursos tinham para pagar o kit de treino e o equipamento.
“Fizeram-se parcerias e protocolos com o Instituto Português do Desporto e da Juventude e a Segurança Social para que ajudassem os mais desfavorecidos que tinham jeito para a bola, mas que as dificuldades financeiras afastavam”, recorda Manuel Magalhães. E assim foi, no último ano de competição a ARD Macieira chegou a ter 7 equipas em diversos campeonatos da AF Porto, entre equipas da formação e seniores.
A par do futebol, o clube desenvolveu o atletismo, que também conta com atletas federados. Um forte bairrismo e uma identidade bem vincada cedo se começou a impor e são vários os jogadores que passaram pelo clube que competem nos dias de hoje nos mais diversos escalões, da I Liga aos distritais.
Com a pandemia, o clube luta para se reerguer. “Antes da pandemia tínhamos cerca de 80 atletas inscritos a competir na formação. Mas com a pandemia acabamos por fechar portas, porque não quisemos assumir responsabilidades, num contexto de saúde pública”, explica Nuno Magalhães, presidente da ARD Macieira. “Não fizemos como alguns clubes, que andaram a treinar às escondidas. Não quisemos correr riscos e fechamos portas”, acrescenta.
Depois de cerca de ano e meio de inatividade, a temporada 2021/22 é encarada como um novo tiro de partida. “O objetivo é tentar recuperar o máximo de atletas para relançar o clube, se conseguirmos fazer pelo menos duas equipas na formação já não será mau”, reconhece o presidente.
As instalações estão pintadas, são limpas pelos próprios dirigentes, “porque aqui temos de saber fazer de tudo”, justifica Manuel Magalhães, que abriu a sala de tratamentos para mostrar que já têm desfibrilador. Lá em casa, a mulher também tem a máquina de lavar a postos para tratar dos equipamentos. A irmã ajuda e com uma mão daqui e outra dacolá, a ARD Macieira promete insistir em exibir o seu brasão nos campos do distrito do Porto. “Será uma forma de continuarmos a levar em frente este projeto que o Cristiano lançou e que o irmão tenta conduzir da melhor maneira possível”, sublinha Manuel Magalhães. À entrada dos balneários a frase é simples, mas lapidar. “Honrem o símbolo que trazem ao peito, orgulhem-se de fazer parte desta família”, porque é mesmo disso que se trata: uma família.